A Padaria da Liberdade, projeto do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) apoiado pela UFMS, celebrou nesta segunda-feira, 23, a marca de um milhão de pães doados à instituições beneficentes de Campo Grande. A Universidade é parceira da iniciativa por meio da oferta de cursos, apoio no controle de qualidade e desenvolvimento de produtos, além da atuação da Fundação de Apoio à Pesquisa, ao Ensino e à Cultura (Fapec) na gestão administrativa da Padaria, localizada no Centro Penal Agroindustrial da Gameleira, unidade masculina de regime semiaberto.
Criada em 2021, a Padaria é um projeto do TJMS executado pela 2ª Vara de Execução Penal de Campo Grande e funciona de forma autossustentável. As instituições do Sistema Comércio também atuam junto ao projeto com a capacitação dos reeducandos com cursos profissionalizantes e na distribuição diária dos pães, por meio do programa Sesc Mesa Brasil.
Para a reitora Camila Ítavo, ter a UFMS entre as instituições parceiras do projeto é uma grande alegria. “Comemorando esses quatro anos, estamos aqui todos juntos pensando em novos avanços e novas tecnologias, e tendo a Universidade e a ciência, em especial os cursos de Engenharia de Alimentos e de Nutrição como grandes parceiros da Padaria da Liberdade e, assim, tendo um desenvolvendo maior a cada dia. Parabéns a todos, contem com a UFMS, é um orgulho para nossa Universidade participar de um projeto tão grandioso e bacana, e que com certeza já é modelo para todo o Brasil. Parabéns!”
Durante o evento de celebração realizado no Restaurante Sesc Sabor e Arte Centro, o vice-reitor Albert Schiaveto reforçou o papel da Universidade no cenário da reinserção social de apenados. “São tantos parceiros e a UFMS não poderia ficar de fora desse momento em capacitação profissional, em participação num projeto de extensão tanto envolvendo professores quanto estudantes, para que a gente possa aprimorar os processos de produção e dar sugestões de novos produtos que podem ser produzidos também na Padaria da Liberdade. Já temos o trabalho dos reeducandos, que também é um trabalho super importante, juntamente com o Poder Judiciário, para que a gente possa ressocializar esses reeducandos, cada vez mais, sendo inseridos, reinseridos na sociedade”.
A diretora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas, Alimentos e Nutrição (Facfan), Luciana Miyagusku, explica que foram realizadas readequações nos itens de coquetel que são produzidos pelos reeducandos, com melhoria nas formulações e precificação para venda. Além disso, duas estudantes do curso de Engenharia de Alimentos da Facfan auxiliaram com a checagem das boas práticas de fabricação. “A professora Camila Ítavo fez o convite à Facfan para que nós desenvolvêssemos todo um trabalho com as formulações e revisão dos trabalhos que a Padaria desenvolve, procurando no futuro certificá-la com o Selo UFMS. Na execução das atividades que eles desenvolvem e nesse trabalho, a primeira macro entrega que fazemos hoje coincide com um milhão de pães doados”, pontua Luciana.
O juiz da 2ª Vara de Execução Penal de Campo Grande e idealizador do projeto, Albino Coimbra Neto, conta que a Padaria foi criada durante a pandemia com a ideia de transformar o direito penal em algo útil à sociedade. “Hoje se doa 1,5 mil pães, onde hoje a gente chegou a um milhão de pães doados, além daqueles que são vendidos diariamente para dar sustentabilidade ao projeto. A Universidade Federal agora participa diretamente do projeto, dando mais qualidade por meio da sua Faculdade, desenvolvendo outros produtos para que essa padaria seja de fato algo útil não só aqueles que estão presos, mas também as pessoas que precisam”.
O juiz explica que há uma seleção entre os apenados para o trabalho na padaria, que consideram a disciplina e a pena aplicada. “O melhor, depois de alguns anos já qualificados, quando saem da unidade prisional e alcançam a liberdade, são muitas vezes contratados pela iniciativa privada”.
Para o diretor da Gameleira, Ricardo Teixeira de Brito, o trabalho desenvolvido pelos reeducandos contribui para a sociedade e os capacita para o futuro. “É um dia muito significativo pra nós. Esse projeto atinge diversas pessoas, a sociedade, as pessoas que recebem a doação e também os nossos internos, que ali trabalham. Eles são capacitados, profissionalizados, aprendem na prática o papel de padeiro e recebem um salário mínimo por mês, que ajuda ele na subsistência dele e da família. A cada três dias trabalhados, o interno diminui um dia na pena dele, o que ele ganha e também a sociedade ganha com a economia do dia dele preso ali. Quando ele sai pra rua, pode entrar no mercado de trabalho com maior facilidade porque já tem uma profissão”.
O presidente do Sistema Comércio Mato Grosso do Sul, Edison Ferreira de Araújo, conta que a participação contribui diretamente com a capacitação dos reeducandos e a distribuição diária da produção. “Desse um milhão de pães que foram produzidos até então, nós distribuímos por meio do Mesa Brasil, do Sesc, mais ou menos dois terços dessa produção. Então, eu acho que nós estamos fazendo o nosso papel. Quando a gente abraça um projeto e faz alguma coisa para alguém sem olhar a quem”.
Júlio César Corrêa faz parte da Padaria da Liberdade há quase dois anos. Para ele, foi uma mudança na perspectiva de vida, e agora, pretende se especializar na produção de tortas e bolos para trabalhar com isso após a saída. “Posso falar pelos meus companheiros, porque eles também sentem o mesmo impacto, que a gente chega naquele local sem noção do que vai acontecer com a vida da gente, e o projeto acarretou coisas boas para mim, para minha família lá fora, que ajuda financeiramente, e ajuda psicologicamente a gente, que ocupa a mente, ocupa o tempo. […] Estou super feliz de estar no projeto, está sendo muito gratificante, pretendo fazer mais bolo e tortas, que desde a infância eu queria aprender, mas foi uma infância meio difícil, e hoje, depois de tantos anos, eu tenho o privilégio, vamos dizer assim, de aprender”.
Para representar todas as instituições beneficentes que são atendidas pelo projeto, a presidente do Instituto de Apoio, Capacitação, Instrução e Economia Solidária do Povo, Ceureci Fátima Santiago, recebeu a doação no evento. Para ela, os pães fazem toda a diferença na instituição. “É uma alegria imensa estar participando desse evento, fiquei muito feliz por ser a representante de todas as instituições, para estar recebendo esses pães hoje e estar junto com vocês. Parabéns ao juiz, parabéns a todas as pessoas envolvidas e gratidão. Gratidão por fazermos levarmos dignidade para as famílias que nós atendemos na periferia”.
Atualmente, sete reeducandos trabalham na Padaria, com a produção média de seis mil pães por dia e doação de 1,5 mil unidades às instituições beneficentes.
Texto e fotos: Rúbia Pedra