Pesquisa analisa indicadores de contaminação de aquíferos a partir de efluentes da suinocultura

Além de avaliar o potencial de contaminação da água subterrânea em São Gabriel do Oeste, a pesquisa “Metais como indicadores de contaminação de aquíferos a partir da fertirrigação com efluentes da suinocultura” quer compreender se o Aquífero Guarani está vulnerável ou não a essa atividade econômica que se estende em todo o chapadão na região.

Essa pesquisa, iniciada em 2015 na Faeng, foi precedida por projetos anteriores realizados na região de São Gabriel do Oeste conjuntamente com a Embrapa Pantanal. Tais projetos estudavam a utilização do efluente de suinocultura para culturas de milho e pasto.

Além de pesquisar a eficiência da fertirrigação com esse efluente, a Embrapa também precisava analisar o impacto dessa prática na água subterrânea porque sabia que a região é área de afloramento do Aquífero Guarani.

“Nessa época, em 2009, fomos convidados a entrar na proposta desse projeto de pesquisa que estava sendo desenvolvido com o Ministério da Ciência e Tecnologia. Tínhamos de analisar na água a presença dos metais que eram adicionados à ração dos animais”, explica a professora Sandra Garcia Gabas, coordenadora da pesquisa na Faeng.

Inicialmente foram analisados zinco e cobre, mas os pesquisadores da UFMS acrescentaram alguns outros metais – arsênio, cádmio, cromo, chumbo, níquel, selênio e estrôncio, que normalmente estão associados à suinocultura, aos agroquímicos – devido à atividade agrícola de mais de 40 anos na região ou, ainda, à rocha que ocorre na localidade.

Cobertura laterítica

“Temos uma camada de rocha que originou esse solo em São Gabriel do Oeste, a qual sustenta o relevo da região – o chapadão. Essa camada recebeu a denominação de cobertura laterítica. Está acima do Aquífero Guarani e ocorre em todo o chapadão, com uma estimativa de 60 a 80 metros de espessura e que nos parece ser bem favorável a retenção dos poluentes”, expõe a pesquisadora.

No solo foi encontrada concentração elevada de ferro, que na natureza tem sempre outros metais associados a ele. Na análise da água subterrânea, as primeiras respostas apontaram a presença de cobre e zinco, mas nada acima dos níveis normais.

“Não sabíamos se esses metais eram do efluente ou se poderia ter outra origem. Saímos investigando com três ou quatro mestrados já finalizados, e temos agora mais um mestrado e um doutorado em andamento”, coloca Sandra.

A água subterrânea foi coletada em dois poços tubulares na área de estudo e de quatros piezômetros – “poço de monitoramento da água subterrânea, que serve para medir a profundidade do nível d´água e coletar amostras dos aquíferos”.

No mais profundo dos piezômetros instalados, foi feita a perfuração em 30 metros, sem que se conseguisse atingir a rocha localizada abaixo da cobertura laterítica.

Além da análise do solo, da laterita e da água subterrânea, os pesquisadores investigaram o calcário que é aplicado para a correção do solo.

Em algumas coletas foram identificados arsênio, chumbo e selênio na água subterrânea; porém, em coleta subsequente tal presença não foi confirmada. “O selênio está presente na ração, o arsênio e o chumbo estão presentes no solo, na laterita e no calcário. Os coliformes estão presentes em concentrações elevadas no efluente. A amostragem da água retirada dos piezômetros e dos poços estavam acima dos padrões de potabilidade em relação aos coliformes”, diz.

Há algumas décadas, arsênio e chumbo, por exemplo, entravam na formulação de alguns agroquímicos. Sabe-se que a laterita, que é rica em ferro, normalmente contém arsênio. O chumbo tem afinidade química com o calcário.

Pelas diversas fontes desses metais, os pesquisadores não descartam qualquer possibilidade de origem e, por isso, continuam a trabalhar com amostras retiradas da área do experimento. Em laboratório na Faeng, foi montada uma bateria – um experimento em escala laboratorial – com solo e efluentes da região de estudo em São Gabriel do Oeste.

A professora explica que estão aplicando com periodicidade esse efluente ao solo e depois coletam da água que fica retida ao solo para analise química do material, de forma a realizarem comparações com as amostras coletadas no chapadão.

Potabilidade da água

A população de São Gabriel do Oeste é 100% abastecida por água subterrânea e do Aquífero Guarani. Nas propriedades rurais e nos assentamentos, localizados no chapadão, os poços são mais rasos, sendo a água retirada do Aquífero Cenozoico. Já na cidade a perfuração é mais profunda e a coleta de água se faz direto do Guarani.

”Não podemos dizer que a água no local está sendo contaminada, até porque em algumas coletas as amostras apresentaram concentrações abaixo e em outras, acima dos padrões. Não podemos afirmar ainda se isso está associado a taxa de aplicação do efluente ou a uma variação natural da quantidade de água no aquífero, porque desde 2014 estamos com um volume de chuva acima do normal. Com mais água pode haver diluição dos íons”, avalia a pesquisadora.

Apesar da dificuldade de identificação de origem dos metais – seja ela natural ou proveniente de algumas atividades humanas, as pesquisas já apontam como conclusivo a presença de patógenos (vírus, bactérias) na água, ou seja, microorganismos degradantes do que resta da matéria orgânica nesses efluentes.

Em pesquisa de dissertação, ao longo de um ano, foi analisada a quantidade de patógenos, tanto nos piezômetros quanto nos poços mais profundos. De uma maneira geral, concluiu-se que há patógenos na água subterrânea, sendo encontrado em maior quantidade nos poços mais rasos. Por enquanto, não há como afirmar se há alguma movimentação de microorganismos no aquífero.

“São os famosos coliformes, proibidos pela portaria de potabilidade. A água pode ser consumida, mas com tratamento, como a cloração”, explica Sandra. Artigo referente será publicado em breve na Revista Brasileira de Recursos Hídricos.

A boa notícia é que todas as atividades que têm fonte de contaminação são realizadas na área do chapadão, que tem uma característica de retenção melhor que o Aquífero Guarani. O aquífero aflora em outras áreas do município, não utilizadas para a agricultura devido à baixa fertilidade do solo, onde há somente pasto.