Universidade institui Clínica Ampliada em Pesquisa e Intervenção Familiar

A vulnerabilidade e os desafios familiares diante da realidade imposta por situações de condições crônicas de saúde, deficiências e transtornos mentais de crianças e adolescentes estão sendo abraçadas em grande projeto inovador na UFMS que passa a oferecer acompanhamento diferenciado para o adequado manejo dos conflitos e desafios dessas famílias. A criação e implantação da Clínica Ampliada em Pesquisa e Intervenção Familiar, na Clínica Escola Integrada, irá permitir a professores, pós-graduandos e profissionais de Enfermagem e Psicologia acompanhar e intervir com famílias em encontros terapêuticos. A proposta surgiu no doutoramento da professora Maria Angélica Marcheti, coordenadora do projeto e membro da Associação Internacional de Enfermagem de Família.

“Essa proposta de intervenção, desenvolvida no Doutorado, fortaleceu as relações familiares e promoveu nas famílias condições de manejo de crise, de tomada de decisões, em benefício da criança, do adolescente e da própria família”, diz a coordenadora. Ela enfatiza que os familiares de crianças e adolescentes que apresentem deficiência, diagnóstico de situação crônica de saúde ou transtornos mentais precisam enfrentar muitos desafios em suas trajetórias e, muitas vezes, se sentem sobrecarregados, frustrados e cansados para manejar as situações de crise emergidas desses contextos, o que requer intervenções que os ajudem e os fortaleçam enquanto um sistema familiar.

20160301_102225“A família precisa ser acompanhada, encorajada, informada e empoderada para que possa tomar decisões e oferecer o cuidado necessário às crianças e aos demais membros familiares”, completa Maria Angélica. Para a formação dos profissionais e pós-graduandos que irão atender na Clínica Ampliada, será realizado em dezembro o curso “Intervenções Familiares em Situação Crônica de Saúde”, de 80 horas, com 25 vagas. Por meio da Clínica Ampliada e do Laboratório de Estudos e Pesquisa em Intervenção Familiar (LEPIF), serão oferecidos cursos para enfermeiros e alunos de pós-graduação que estarão discutindo, estudando os referenciais conceituais e as ferramentas para a intervenção com famílias, que serão encaminhadas à Clínica pelo Hospital Universitário, unidades da rede estadual e municipal de saúde, e associações que trabalham com essas crianças e adolescentes.

Os atendimentos irão gerar uma série de informações a serem catalogadas no laboratório LEPIF, vinculado ao CNPq. O LEPIF reúne pesquisadores nacionais e internacionais que desenvolvem estudos com família e intervenção. O projeto conta ainda com o desenvolvimento de um aplicativo e capacitação a distância pelo Moodle que será disponibilizado a profissionais, alunos e famílias. Todo esse trabalho é parte de um projeto guarda-chuva que tem parceria e pesquisas sendo realizadas conjuntamente com o Canadá, a Universidade Federal de São Paulo, Universidade de São Paulo (USP – Ribeirão Preto), a Universidade Federal de São Carlos e os cursos de Enfermagem da UFMS, câmpus Campo Grande e Coxim com as professoras Bianca Cristina Ciccone Giacon (vice-coordenadora do projeto) e Juliana Wolf Pereira (Curso Sistemas de Informação), curso de Psicologia da UFMS com a professora Alexandra Ayach Anache, podendo ser ampliado para os demais integrantes da equipe profissional de saúde, de outras áreas como a antropologia, sociologia, educação e outros.

Intervenção

20160301_093949O trabalho de intervenção, fruto de Doutorado, foi inicialmente desenvolvido em uma associação para crianças e adolescentes com deficiência em Campo Grande e deu base ao livro “Criança e Adolescente com Deficiência: Programa de Intervenção de Enfermagem com Família”, que está sendo lançado pelas professoras Maria Angélica Marcheti e Myriam Aparecida Mandetta.

O material tem três bases fundamentais: o Interacionismo Simbólico, ou seja, como a família simboliza as interações que ela tem com a situação; o Modelo de Vulnerabilidade da Família, em que a família experiencia a perda de autonomia e ameaça constante à sua integridade e o Modelo de Resiliência Familiar, em que se define a resiliência como um processo que deve ser fortalecido por intervenções.

Para este trabalho, a professora também utiliza o modelo canadense Calgary de Avaliação e Intervenção com Família. “A Clínica Ampliada que estamos montando tem o mesmo modelo da unidade da família de Calgary (Canadá), a única no mundo que atende famílias nessas condições, e a nossa aqui será a próxima”, comenta. O modelo tem ainda como ferramentas a entrevista com família realizada em encontros terapêuticos, a avaliação de suas forças e a identificação dos seus desafios, a elaboração de seu genograma e ecomapa, a troca de ideias e identificação de crenças da família, e a definição e aplicação do processo terapêutico, as intervenções propriamente ditas.

“Não é o profissional que irá efetuar mudanças nas interações da família, mas ele pode possibilitar a ela um espaço para que se expresse e identifique outras formas de manejo das situações e dos conflitos e efetuar as mudanças que considerar necessárias ao seu melhor funcionamento. É um processo terapêutico que abre espaço para a família discutir o que está acontecendo, falar sobre os sentimentos gerados, os desafios, e possibilitar a ela reconhecer o que já conquistaram na trajetória com o filho e em família. A intervenção possibilita conversarmos sobre o assunto sem pré-julgamentos e assim chegar a uma proposta terapêutica, além de aliviar o sofrimento da família”, explica Maria Angélica.

Com todo esse processo, a família muda seu foco da deficiência ou da doença, que antes era o centro de tudo e consegue colocar o problema no lugar certo, ou seja, estabelece-se um vínculo familiar mais saudável, menos comprometido pela situação, o que alivia o sofrimento. Segundo a coordenadora, a partir disso, a família sente-se mais empoderada para efetuar mudanças, tomar decisões, manejar as situações conflituosas, confrontar condutas profissionais que desconhece e buscar informações.