Momento exige cuidados essenciais com o emocional

Em tempos de isolamento, mais do que cuidados sanitários necessários para combater a proliferação do coronavírus, o estresse, a angústia, a impotência e o medo exigem de cada um momento especial também para cuidar do emocional.

O distanciamento e a ansiedade gerados pelo mal invisível, e que muitas vezes geram sofrimentos psíquicos, devem dar espaço a atitudes que põem em prática a positividade e ao saber trabalhar a mente.

Na UFMS, os alunos trocaram o ambiente presencial pelo virtual e deverão ocupar seu tempo nas próximas semanas com videoaulas, chats, troca de experiências, leituras, filmes, documentários e outras atividades que estão sendo estimuladas pelos professores. Assim como os servidores que assumiram seus postos de casa no teletrabalho. O que mais é preciso para ocupar e bem direcionar a mente?

A professora Aline Reis, da Faculdade de Ciências Humanas (Fach), acredita que o momento exige adaptações. “Dividir o tempo entre as obrigações profissionais, o trabalho com a casa e a atenção à família. Muitos conflitos podem acontecer devido à maior proximidade por um tempo prolongado. Mas também pode ser uma oportunidade de se aproximar e estreitar laços distanciados pela correria do cotidiano. A incerteza quanto ao futuro e a ansiedade decorrente podem servir para refletirmos sobre o que valorizamos e como administramos o nosso tempo. Em que estamos investindo nosso tempo, nossa saúde e atenção? É algo essencial, relevante?”, questiona.

Apesar de ser um momento de crise em muitos sentidos, essa pode ser uma oportunidade para resgatarmos o nosso senso de coletividade, afirma a professora Aline.

“Podemos pender para o egoísmo, ao ir ao mercado e estocar quantidades de comida e materiais de higiene que excedem nossa capacidade de uso, ou podemos compartilhar, mandar uma mensagem para nosso vizinho idoso perguntando o que podemos fazer para ajudá-lo. Aqueles que moram sozinhos podem fazer uso da tecnologia para diminuir a solidão física. Esse momento só será ultrapassado com êxito se cada um fizer a sua parte”, expõe.

Para o professor Tiago Ravanello, coordenador do curso de Psicologia da Fach, “sermos responsáveis quanto ao desafio que se coloca a nossa frente nos exige estarmos resguardados em casa, evitarmos ao máximo o convívio social e, por consequência, as probabilidades de contágio. Por outro lado, superdimensionar o fato também nos impõe um perigo: o de vivê-lo como uma experiência sem tempo, sem término e sem limites”.

Próximos de uma crise sanitária que poderá nos levará também a uma crise humanitária, avalia Tiago, o importante é frisar que haverá um início, um meio e, certamente, um fim.

“Esse momento de ruptura em nossa história que vai colocar um antes e um depois da COVID-19 nos exige a difícil tarefa de construirmos limites para essa realidade. Em casos de grande sofrimento coletivo, tendemos a crer que o nosso sentimento de continuidade na vida e na realidade também é abalado (como acontece em grandes tragédias, tais como o incêndio da Kiss, o rompimento das barragens de Brumadinho e Mariana, a queda do avião que levava a equipe de futebol da Chapecoense, citando apenas exemplos recentes e salvo as devidas proporções). Mas justamente o que marca essas experiências e lhes dá o seu caráter traumático é que elas são, antes de tudo, transitórias”, aponta o professor.

A avidez por informações, diante de uma ameaça ainda não completamente decifrada, pode levar também a uma angústia existencial.

“Esse sentimento de indeterminação do perigo que nos leva a não saber muito bem quais os limites da nossa própria existência ou dos efeitos da ação dos outros sobre nossa realidade acaba sendo experimentado por muitos como um sofrimento incapacitante. E isso também passará. A COVID-19 nos exigirá um tipo de enfrentamento bastante complexo que é o de não ser revivido de forma incessante, mas também, de não ser esquecido. Esse meio-termo entre nos permitir ser transformados pelo evento sem que tenhamos que nos perder nele é a grande questão que se coloca em termos de nossa saúde mental”.

O professor Tiago destaca ainda duas situações que considera fundamentais para se encontrar esse caminho particular de crescimento em meio à dor: a possibilidade de questionar o que nos é realmente significativo e a de restituir o lugar e a importância do saber, com crescente interesse coletivo por sua construção, suas formas de validação e transmissão.

“A reclusão imposta pela quarentena não precisa ser experienciada necessariamente como um momento de isolamento, e aí começamos a repensar como estamos construindo as nossas redes de contato social. Deixaremos para trás, e temporariamente, uma série de objetos de consumo que talvez venham a se tornar supérfluos ou, ainda, que isso nos permita ir mais a fundo na crítica de que acreditamos muito mais no consumo como uma forma de bem-estar do que realmente deveríamos”, expõe. Apesar do enorme desafio a nossa frente, Tiago acredita que faremos dessa história o princípio de transformações muito mais significativas.

Cartilha

O Serviço de Psicologia e Acessibilidade do Campus do Pantanal elaborou a “Cartilha de orientações para saúde psicológica da comunidade acadêmica no enfrentamento do Coronavírus”, para auxiliar no manejo das implicações psicológicas causadas pelo período de quarentena.

A Cartilha traz dicas sobre a busca de orientações, rotina pessoal de atividades, uso de recursos tecnológicos, autocuidado, planejamento de atividades de distração, consciência na tomada de decisões, entre outros itens e, ao final, quadro de organização de rotina de estudos e trabalho.

Veja abaixo algumas estratégias de manejo sugeridas pelos professores e pela Universidade de Harvard:

– Mantenha-se informado e se atenha aos fatos;

– Coloque as coisas em perspectiva – restrinja o tempo em que se expõe às notícias e foque nas coisas boas que você tem em sua vida, demonstrando gratidão em relação a elas.

– A ansiedade pode nos levar à sensação de sobrecarga e desamparo. É importante reconhece-la e validá-la, mas regular sua intensidade: “é compreensível que eu esteja preocupada com essa situação, mas sei também que a preocupação não é uma resposta efetiva para lidar com os problemas;

– Foque no “aqui-agora”, evitando catastrofizar sobre o futuro.

– Busque atividades que são o oposto à preocupação: leitura, música, filmes.

– Procure ajuda de um profissional da psicologia se essa situação está além de suas habilidades atuais de manejo. O Conselho Federal de Psicologia regulamentou o atendimento online e essa é uma excelente opção de acesso ao profissional em tempos de necessidade de afastamento social.

– Mantenha-se em contato virtual com as pessoas que ama, estreite laços e, sempre que possível e seguindo as orientações de higiene e segurança, pratique a solidariedade.

Texto: Paula Pimenta