Lixo plástico em praia da Malásia. Crédito: epSos.de CC-BY-2.0

Cientistas de diversos países reúnem-se para analisar estudos sobre mudanças no meio ambiente

O encontro resultou na recente publicação conjunta de um artigo em periódico internacional sobre síntese em Ecologia

Mais de cem pesquisadores de pelo menos 13 países reuniram-se para encontrar respostas e soluções para enfrentar as complexas mudanças que vêm ocorrendo no meio ambiente do planeta. Entre eles está o professor do Instituto de Biociências (Inbio) da UFMS Diogo Borges Provete. “O Centro Nacional de Análise e Síntese Ecológica da Universidade da Califórnia, Santa Bárbara, abriu uma chamada e pediu para os interessados enviarem propostas para participarem de um workshop. Houve uma seleção e eu fui chamado para integrar o grupo de pesquisadores para realização dos estudos”, contou.

O workshop sobre o futuro da síntese em Ecologia foi realizado de forma remota, em fevereiro de 2021. Pesquisadores de seis instituições norte-americanas conduziram as discussões em torno dos temas “Na próxima década, vamos enfrentar enormes desafios ambientais e precisamos galvanizar esforços globais para os enfrentar”, disse o ecólogo Ben Halpern, que liderou o grupo. “Reunimos uma comunidade diversificada de ecólogos e cientistas ambientais para partilhar ideias e questões-chave, e ajudar a resumir tudo isso num conjunto de prioridades para orientar a comunidade científica na próxima década. Esperamos que as pessoas possam utilizar esse trabalho para apoiar os seus esforços para resolver problemas urgentes”, completou.

De acordo com Halpern, o grupo identificou vários tópicos prioritários: diversidade, inclusão equitativa e justiça; sistemas humano-ambientais acoplados; ciência acionável e inspirada no uso; escala; generalidade, complexidade e resiliência; e previsibilidade – todas essas questões se tornam mais significativas à medida que as oportunidades para a ciência de síntese crescem em escopo, escala e velocidade da coleta de dados. “Foram criados grupos de trabalho menores para discutir sobre alguns temas previamente escolhidos. Alguns meses depois do evento, começamos a trabalhar em um manuscrito que contou com duas a três rodadas de revisão, abertas a todos os autores”, contou Diogo.

“A versão inicial do texto já trazia alguns componentes que foram discutidos durante os grupos de trabalho individuais, a partir dos brainstorms. O próprio grupo gerou uma lista preliminar de aspectos que deveriam ser priorizados em iniciativas futuras de síntese. Uma grande preocupação da equipe de autores e dos líderes foi a de manter e proporcionar equidade e igualdade de oportunidade para pessoas de diferentes gêneros e origens/locais, como forma de tornar o processo de geração de conhecimento mais diversa”, falou o pesquisador do Inbio da UFMS.

Foto: Kirk Olson

Segundo Diogo, o artigo final foi submetido no periódico Ecosphere, sendo aceito em setembro de 2021 e publicado neste mês de janeiro (leia aqui). “Considero um privilégio ter tido a oportunidade de participar do workshop e do grupo. Não só pude assistir às palestras de referências na área de síntese em ecologia, mas também contribuir durante as discussões para os grupos de trabalho específicos. Foi bem-vinda essa perspectiva que trouxe do sul global, sendo inclusive algo ressaltado na versão final do artigo”, relatou Diogo.

Resultados

“Houve uma grande ênfase na diversidade, equidade, inclusão e justiça como ponto focal para a pesquisa da síntese, representando uma mudança significativa no processo de como síntese em ecologia é feita”, disse Halpern. Ao reduzir as barreiras à diversidade dos participantes, de acordo com os pesquisadores, os cientistas de síntese seriam capazes de definir e responder melhor às perguntas que resultariam em políticas mais relevantes e com maior impacto para comunidades mais inclusivas.

As outras prioridades, observou Halpern, “incluem as que têm sido questões-chave durante décadas e que ainda permanecem não resolvidas e altamente prioritárias, bem como novos tópicos”. Questões como a forma como os valores humanos e as decisões afetam os resultados ambientais; como incorporar o conhecimento local, indígena e experiencial; e como abordar a complexidade que emerge à medida que as mudanças num sistema conduzem à grandes mudanças noutros, foram assinaladas pelo grupo de workshop, que contou com membros de várias fases de carreira, instituições, backgrounds e locais de origem.

Entretanto, a ciência da síntese deve também incorporar a compreensão através de escalas espaciais e temporais, ao mesmo tempo em que adquire replicação suficiente e evita vieses na sua busca por princípios gerais para explicar padrões e processos. De acordo com os pesquisadores, ao abordar questões ambientais prementes deve-se adotar uma abordagem em que as previsões sejam testadas iterativamente e atualizadas com feedback contínuo, em oposição a alcançar previsões “perfeitas” num mundo em constante mudança.

Pesquisador Marcos Rafael Severgnini, do Laboratório de Síntese em Biodiversidade da UFMS, durante atividade de campo

No processo e prática da ciência da síntese, o grupo identificou dois tópicos comuns: expandir a participação e aumentar a disponibilidade de dados. Devem ser feitos esforços para apoiar a representação e integração de diversos cientistas e perspectivas, e envolver as comunidades marginalizadas, afirmaram, ao mesmo tempo que geram, integram e dão acesso a dados de alta qualidade.

Embora a taxa de alterações climáticas esteja aumentando, com efeitos que por vezes podem parecer assustadores para os pesquisadores que os estudam, Halpern sentiu-se encorajado pela disposição dos participantes no workshop de apresentarem e partilharem ideias – um modelo que ele espera torne-se um caminho para a pesquisa de síntese.

“Nunca liderei um trabalho com tantos co-autores, e de forma a dar prioridade à igualdade de voz e participação”, disse ele. “Este trabalho foi verdadeiramente um esforço de colaboração a uma escala que nunca imaginei possível. Foi realmente inspirador envolver tantas pessoas, e aprendi muito ao ouvir o feedback e as revisões e conversas que se seguiram durante o processo de redação e revisão deste trabalho”.

Síntese ecológica no mundo e no Brasil

Professor Diogo na Summer School do iDiv (terceiro, da esquerda para direita, na primeira fila, e com jaqueta azul na imagem em detalhe)

O Centro Nacional de Análise e Síntese Ecológica da Universidade da Califórnia foi o grande primeiro centro de síntese a surgir no mundo, em 1995. “Hoje temos outros no Estados Unidos, um pouco menos amplos, e na Europa também, como iDiv, do qual inclusive já participei de uma summer school em 2015. Aqui no Brasil começamos a propor esse tipo de iniciativa em 2021, com o Sinbiose do CNPQ, ainda em fase inicial”, lembrou Diogo, que também é responsável pelo Laboratório de Síntese em Biodiversidade do Inbio/UFMS.

Sínteses de conhecimento não são resumos de conhecimentos sobre um determinado assunto, mas transbordamentos de novos conhecimentos decorrentes da integração de disciplina, que se encontram, se confrontam e se misturam adquirindo nova forma. Para que isso ocorra, é fundamental que se crie ambientes que favoreçam a criatividade por meio da integração de métodos e perspectivas, acadêmicas e não acadêmicas, criando análises e conceitos que vão além das fronteiras das disciplinas acadêmicas.

Esta integração de dados abre o horizonte para análises de grandes bases de dados, criação de modelos, cenários e a busca por soluções para grandes questões contemporâneas. Em razão disso, muitas destas sínteses configuram poderosos instrumentos de informação qualificada para a tomada de decisão em questões de relevância social ou ambiental. Para a produção desse novo saber, dois ingredientes são fundamentais na relação entre pesquisadores e saberes: a diversidade e a cooperação.

As sínteses do conhecimento podem ser elaboradas por diferentes arranjos institucionais envolvendo universidades, centros de pesquisa, órgãos governamentais ou multilaterais, entidades que representam conhecimento local ou indígena. Em termos de duração, as sínteses podem acontecer em formato de curta duração, como órgãos e entidades que encomendam estudos desta natureza, ou de forma mais perene, como as realizadas em centros de síntese. Os centros de síntese de conhecimento são infraestruturas longevas dedicadas a estimular a pesquisa colaborativa entre grupos e redes de pesquisa interdisciplinares, em um ambiente criativo que visa proporcionar o aprendizado em grupo.

O diferencial de um centro de síntese é apoiar em termos logísticos e técnicos (TI, comunicação, acompanhamento das equipes, apoio internacional) os grupos de especialistas com diversos perfis (especialidade, gênero, faixa etária, etnias, etc.) a inovar em termos de novos conhecimentos, favorecendo a criação de confiança entre os membros do grupo.

 

Texto: Vanessa Amin, com informações do NCEAS e CNPq.

Imagens: reprodução do Youtube/NCEAS, acervo IDIV, acervo do Laboratório de Síntese em Biodiversidade da UFMS e CC BY