Programa de Doação de Corpos homenageia doadores e familiares

Como parte da campanha Eu Respeito, que em dezembro tem o tema a Gratidão, o Programa de Doação de Corpos da UFMS promoveu uma cerimônia de homenagem aos doadores, com o intuito de levar ao público informações sobre a possibilidade de doação do próprio corpo para fins de ensino, pesquisa e extensão na área de Anatomia Humana, de acordo com a Lei Nº 10.406, de 2002. A iniciativa auxilia na formação de profissionais de saúde, que necessitam de aulas práticas sobre estruturas e funções do corpo humano, além da utilização de livros e aulas teóricas. O evento foi realizado na noite de ontem, 3, no auditório do Complexo EaD e Escola de Extensão, localizado no setor 2 da UFMS de Campo Grande.

A reitora Camila Ítavo convidou os estudantes, servidores e familiares presentes a compreenderem a evolução do estudo anatômico no mundo e como a Instituição chegou ao Programa de Doação de Corpos. “Eu fico imaginando como transformar a dor na saudade, ou a decisão em vida, que não é fácil também, para os que decidiram, e entender a grandeza do gesto. Vocês não ajudarão só os estudantes da área de saúde da Universidade. Vocês ajudarão todas as pessoas que eles vão atender. Tem algo muito forte que a gente fala que nosso médico, nosso fisioterapeuta, nosso enfermeiro, todas as pessoas precisam pegar a mão. Como pegar a mão se ele tem uma peça de plástico? Como experimentar? Em nome da Universidade Federal, […] eu posso dizer que sempre serão muito bem cuidados, respeitados por essa galera, esse time maravilhoso da Universidade, liderados e coordenados pela professora Roberta e por toda a equipe”, garantiu.

“Que lindo hoje a gente pensar em um programa belíssimo como esse, fortalecendo o ensino e a ciência. […] Nós não estamos acostumados com a finitude. A gente sempre faz planos, a gente pensa no amanhã. Às vezes, a gente briga, acha que a gente é muito poderoso e vem a vida e fala ‘não, a gente é finito’. Vocês têm um tempo na Universidade, daqui a pouco vão para outros desafios. Hoje estamos aqui, amanhã podemos não estar. Acho que essa é a grande magia da vida. A reflexão sobre a finitude nos torna mais humildes, humanos e coerentes”, complementou a reitora.

O vice-reitor Albert Schiaveto relembrou sua experiência como professor de Anatomia e como diretor do Instituto de Biociências (Inbio). “Uma pessoa é totalmente diferente de uma peça sintética, mas ela é outro ser humano e é aí que começa o vínculo dos nossos profissionais da área de saúde com as pessoas, com o ser humano. O significado de ter as aulas é completamente maior do que só a textura, é o vínculo com o outro, é ali que a gente desenvolve. Esse tipo de cerimônia é uma coisa impressionante, o impacto que uma cerimônia como essa, um projeto como esse, o envolvimento desses alunos, a formação deles, é algo que não tem preço”, falou. “[A doação] é um ato de amor da pessoa e da família, é uma maneira de continuar viva. Viva não só fazendo a diferença, porque esses profissionais de saúde vão continuar esse legado para frente, quem sabe serão professores formando novos profissionais, é uma coisa eterna. […] Estou muito feliz, emocionado, vida longa a esse programa”, desejou.

A diretora do Inbio, Carla Arruda, demostrou a felicidade em acolher e homenagear os doadores e seus familiares. “É uma questão muito do professor, a gente pensar em continuar ensinando mesmo depois da morte. […] É o respeito à vida proporcionado pela morte. A importância desse ato, da gente eternizar um corpo, porque ele fica eternizado na memória dos estudantes, não só na memória dos familiares da pessoa, mas na memória dos estudantes, como conhecimento. Acho que não existe nada mais nobre do que isso”, reforçou.

A coordenadora do programa e do projeto Anatomizar, Roberta Cavalcanti, relembrou o trabalho realizado pela professora Jussara Peixoto Ennes para que a iniciativa fosse concretizada na UFMS. “É uma honra muito grande coordenar esse projeto hoje, esse projeto foi idealizado pela professora Jussara. Ela levou quase oito anos para conseguir fazer o Programa de Doação de Corpos funcionar no nosso Estado. Apesar dele já funcionar em outras cidades, já terem leis que aprovassem isso, foi uma luta muito grande dela para que esse projeto conseguisse acontecer aqui. […] [Esse evento também serve] para que todos os familiares possam continuar prestando as homenagens aos seus entes queridos. A gente vai tentar sempre manter essa cerimônia para que vocês possam continuar tendo essas homenagens e o nosso intuito agora é sempre ampliar esse projeto para a gente conseguir melhorar a qualidade do ensino aqui na nossa Universidade”, discursou.

O estudante Lucas Gonçalves, do curso de Fisioterapia do Instituto Integrado de Saúde, foi o responsável por ler a oração ao cadáver desconhecido, de Karl Rokitansky, e contou sua experiência. “Estive um ano fora em uma outra universidade e foi totalmente peças sintéticas que eu abordei. Quando eu vim para a UFMS, consegui observar a diferença de uma peça sintética para uma peça real e isso é real, é nítido. O desenvolvimento dos estudantes daqui é totalmente diferente, são outros profissionais quando você pega na peça real”, relatou.

“É um momento que nós reconhecemos que o nosso aprendizado começa literalmente nas mãos de alguém, que mesmo após a morte, escolheu continuar ensinando. Essas admiráveis pessoas oferecem um tipo de aula que nenhum livro, atlas ou vídeo consegue substituir. Elas nos permitem conhecer o corpo humano, não apenas como estrutura, mas como história. Cada músculo, cada artéria, cada nervo que seguramos é parte de uma vida que existiu, de alguém que amou, sonhou, construiu e, generosamente, decidiu contribuir para a formação de futuros médicos, fisioterapeutas, enfermeiros e muitos outros profissionais”, falou a estudante Beatriz Mannarelli, do curso de Medicina da Faculdade de Medicina (Famed).

“Eu vi o quão nobre é aquela peça, o quão nobre foi aquele indivíduo, o quão nobre ele é. Esse legado que ele está passando, não só para mim, mas todos os alunos que estão ali, com aquela peça me marcou de um jeito inexplicável. Eu sei que vou ser uma profissional muito melhor, eu sei que vou ser um ser humano muito melhor, um indivíduo muito melhor, por conta dessa experiência”, complementou a também estudante da Famed Maria Eduarda Castro.

No momento, o programa possui três doadores que já faleceram e outros 22 cadastrados ainda em vida. Para mais informações sobre a iniciativa, acesse a página.

Texto: Thalia Zortéa

Fotos: Lúcia Santos