Foto: Mauricio de Almeida Gomes

Pesquisadores apontam perigo da fragmentação de habitats para a biodiversidade

É prematuro e inseguro sustentar a afirmativa que somente a quantidade total de habitats em uma determinada área importa para a manutenção da biodiversidade local, sendo indiferente o percentual de fragmentações (subdivisões).

Essa é a grande polêmica em ecologia de paisagens e que levou um grupo de aproximadamente 70 pesquisadores – entre eles o professor Mauricio de Almeida Gomes, do Programa de Pós-graduação em Ecologia e Conservação, a publicar na renomada revista Biological Conservation o artigo contestativo “Indirect effects of habitat loss via habitat fragmentation: A cross-taxa analysis of forest-dependent species” (Efeitos indiretos da perda de habitat via fragmentação do habitat – uma análise multitaxonômica de espécies dependentes de florestas).

Na verdade, a configuração também importa, segundo os pesquisadores. ‘Mostramos no resultado do trabalho que a fragmentação afeta a riqueza de espécies florestais, para vários grupos – anfíbios, mamíferos, aves, plantas. Fizemos uma análise para a Mata Atlântica inteira, e sim, a fragmentação tem efeitos negativos pelo que chamamos de efeito de borda”, explica o professor Mauricio.

Foto: Luciana Ardenghi Fusinatto

Efeitos de borda seriam as alterações ocasionadas na borda de um ambiente, geralmente provocando redução da umidade, aumento de temperatura, mudança de composição de espécies, redução dos tamanhos das populações, uma série de alterações físico-químicas e biológicas que afetam os animais que vivem nessas manchas, especialmente os mais sensíveis.

Tudo isso gera um efeito cascata, pois com a redução dos habitats, muitas espécies se tornam mais suscetíveis às extinções locais, já que as populações espalhadas podem não ter conexão entre si, por não existir fluxo biológico entre elas, e isso leva, ao longo do tempo a menor recolonizarão pela dificuldade de atravessarem a matriz, que são as áreas entre as manchas de habitats. Dessa forma, ocorre a redução de variabilidade genética, com aumento de chances de endocruzamento.

Ao ficarem isoladas, as populações ficam mais sujeitas às extinções estocásticas, segundo o professor. Se ocorre um incêndio ou uma doença, e a população é grande, perde-se alguns indivíduos, mas a população continuará lá. Mas numa mancha pequena, as populações também são menores, então dependendo do fenômeno, a população pode desaparecer e não ser recolonizada, porque não tem como outros indivíduos da espécie chegarem.

“Ou seja, tudo isso, em conjunto, nos leva a crer que não apenas a quantidade de habitat importa, embora este seja o fator mais importante. A fragmentação do habitat também importa, tendo efeito negativo sobre muitas espécies de vários grupos taxonômicos, afirma o pesquisador.

A fragmentação tem efeito negativo e geralmente as espécies generalistas são as únicas a beneficiarem do processo, de acordo com o pesquisador. “Um pardal, por exemplo se beneficia de um ambiente muito alterado. Mas as espécies de interior de florestas, tendem a reduzir ou desaparecer. Então ocorre uma substituição de espécies, saem as especialistas e entram as generalistas”, diz Maurício.

Hipótese

Foto: Mauricio de Almeida Gomes

A hipótese de a fragmentação não importar para a manutenção da biodiversidade foi primeiramente lançada em 2013 pela pesquisadora canadense Lenore Fahrig, que desde então tem assinado diversos artigos nessa linha.

“Ela advoga que só a quantidade importa e é o fator que prediz a riqueza de espécies, ou seja, se tenho uma área de floresta com 50% preservados, independe se está tudo num único bloco florestal ou se a floresta está dividida em vários pedaços”, expõe.

“Afirmar que a fragmentação de habitats não importa pode ser prematuro e perigoso, principalmente se isso interferir em políticas públicas. É muito melhor manter os 20% de reserva legal em uma única área do que ter vários pedacinhos de habitats na propriedade. E ainda tem que se considerar que geralmente o proprietário escolhe as piores áreas para preservação, que são as menos economicamente viáveis, como topo de morro”.

Para testar os efeitos da quantidade e da fragmentação de habitat, os pesquisadores utilizaram um extenso banco de dados com diversos grupos taxonômicos ao longo da Mata Atlântica brasileira.

O grupo utilizou uma abordagem de modelagem de equações estruturais, respondendo não apenas pelos efeitos diretos da perda de habitat, mas também por seus efeitos indiretos (via fragmentação do habitat), na riqueza de espécies dependentes da floresta.

Os pesquisadores separaram a área em gradientes de 0-30%, de 30-60% e de 60- 100% e revelaram que além dos efeitos da perda de habitat, a fragmentação tem impactos negativos na riqueza de espécies de animais em níveis intermediários (30-60%) da quantidade de habitat e na riqueza de plantas em níveis altos (> 60%) de quantidade de habitat , ambos mediados por efeitos de borda. “Não há evidências suficientes para afirmar de fato que a fragmentação não tem importância, porque os resultados têm sido controversos”.

Texto: Paula Pimenta