Pesquisa indica altas taxas de distúrbios mentais causados pelo isolamento

A terceira etapa da pesquisa Saúde Mental e Bem-estar na Pandemia já está disponível para participação da comunidade acadêmica no site ufms.br/coronavirus. O foco do questionário é monitorar os sentimentos, sintomas e vivências de estudantes, professores e técnicos-administrativos.

A pesquisa é desenvolvida desde 2020 na UFMS, mas, com esta etapa, o objetivo é expandir o levantamento de dados para a região Centro-Oeste. Para tanto, foi firmada uma parceria com a Universidade Federal de Mato Grosso, a Universidade Federal de Goiás e a Universidade de Brasília.

O professor Cremildo Baptista é coordenador do projeto e, segundo ele, algumas questões muito importantes foram identificadas até o momento, com os resultados obtidos com as fases anteriores da pesquisa, como distúrbios de saúde mental e aumento no uso de substâncias psicoativas.

“Nós verificamos na primeira etapa altas taxas, escores altos, sobre ansiedade, estresse e depressão, todos eles ficaram acima de 40% e eles foram significativamente mais presentes entre os estudantes, quando comparamos com técnicos e professores, e também entre as mulheres, em comparação com os homens. Vemos também que os escores altos de ansiedade, estresse e depressão foram mais frequentes naqueles participantes que disseram que passaram por dificuldades financeiras durante o período de isolamento e também entre aqueles que disseram que consomem substâncias psicoativas, como por exemplo, álcool, tabaco, maconha, anfetaminas, etc.”, comenta Cremildo.

Segundo o pesquisador, o estudo não mostra se o aumento no uso dessas substâncias ocorreu por conta dos quadros de ansiedade, depressão e estresse, ou se as pessoas já faziam uso delas e, por conta da pandemia, agora também enfrentam os distúrbios. Independentemente, os dados mostram que há algum tipo de ligação entre ambos. “A gente ainda não consegue no nosso estudo medir o que veio antes”.

Com as respostas concedidas nos questionários anteriores também ficou provado que atividade física colaborou “É importante a gente destacar que nós observamos na pesquisa, mesmo que de forma preliminar, que alguns fatores foram protetores, protegeram as pessoas contra escores altos de ansiedade, depressão e estresse. Quais foram os fatores: a prática de alguma atividade que proporciona bem-estar, como por exemplo as pessoas que estão fazendo caminhada, corrida, academia, yoga, meditação, jardinagem e pintura, etc. Essas pessoas reportaram menos escores altos de depressão, ansiedade e estresse em comparação àqueles que não fazem essas atividades que proporcionam bem-estar, então a gente vê aí uma questão psicológica importante, que é praticar alguma atividade que proporciona bem-estar, que é fundamental para a gente conseguir é passar bem período de pandemia”, recomenda.

Os índices desses distúrbios emocionais também são menores para as pessoas que possuem acesso à Internet e computadores em casa, o que, para Cremildo, significa que há menos preocupação sobre como manter as atividades de trabalho e estudo, além desses itens também proporcionarem entretenimento.

O aumento no consumo de bebidas alcoólicas foi contabilizado por diversas razões durante o período de isolamento. “Nós verificamos também que esse aumento que esteve associado a sentimentos de falta de interação, uma interação social não mediada por TICs, interação pessoal e social ‘cara a cara’, ‘face a face’ mesmo. Aquelas pessoas que sentem falta disso acabaram reportando mais o aumento do consumo de bebidas alcoólicas do que aquelas que não disseram que não sentem essa falta. As pessoas que também reportaram dificuldades financeiras durante esse período de isolamento com mais frequência reportaram aumento do consumo de bebidas alcoólicas, então provavelmente era uma estratégia de fuga, de fugir dos problemas, da falta de dinheiro, de comida, talvez da falta de dinheiro para pagar a água, pagar a luz, pagar aluguel… parece que as pessoas acabam bebendo para fugir disso”, relata Cremildo.

As pessoas que relataram piora na autoavaliação do estado emocional também responderam que o consumo de bebidas alcoólicas aumentou neste período, bem como as que já tinham algum tipo de distúrbio mental já diagnosticado.

Violência doméstica

Um dado importante obtido na pesquisa sobre Saúde Mental e Bem-estar na Pandemia foram os casos de violência doméstica reportados nos questionários. “Na segunda etapa, um dado que que foi interessante, que foi importante, é em relação a sofrer violência doméstica durante esse período de isolamento. Nós encontramos uma taxa de 8% que, em comparação às taxas de violência doméstica que a gente vê aí pelo Brasil, ela é importante, é relevante, e o maior relato foi entre as mulheres”, afirma o professor. “A gente sabe que a nossa sociedade é machista, patriarcal e as mulheres são as que mais sofrem violência doméstica nas mais diversas maneiras, em comparação aos homens – isso não quer dizer que não houve homens que reportaram, houve também, mas as mulheres são as que mais sofreram”.

De acordo com Cremildo, a ocorrência de violência doméstica foi mais alta entre os estudantes, em comparação com técnicos e docentes, e mais alta naqueles que têm nível fundamental ou médio completo, comparados àqueles com nível superior, como graduação, mestrado e doutorado.

Caso você seja vítima de violência doméstica e/ou violência contra a mulher, ou conheça alguém que seja, não hesite em buscar ajuda. A Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180 presta uma escuta e acolhida qualificada às mulheres em situação de violência, e registra e encaminha as denúncias de violência contra a mulher aos órgãos competentes. A ligação é gratuita e o serviço funciona 24 horas por dia, todos os dias da semana.

Texto: Leticia Bueno