Grupo de pesquisadores avalia efeitos do treinamento de sprint em pessoas com depressão

Considerada um transtorno mental frequente em pessoas de todas as idades, a depressão interfere na vida de milhões de pessoas em todo mundo, tornando-as incapazes de fazer atividades básicas como se alimentar, dormir, levando até a incapacidade de trabalhar e, nos casos mais graves, ao suicídio. Dados divulgados pela Organização Pan-americana da Saúde (Opas), ligada a Organização Mundial de Saúde, estimam que mais de 300 milhões de pessoas sofram com os sintomas e cerca de 800 mil morrem por suicídio a cada ano, sendo essa a segunda causa principal de morte entre pessoas com 15 a 29 anos.

A depressão, inclusive, é, hoje, a principal causa de incapacidade no trabalho. Os sintomas podem diferir de pessoa para pessoa e, apesar do histórico familiar ser um fator importante, a depressão pode afetar indivíduos que não têm fator genético, seja pela combinação de outros fatores como biológico, ambiental e psicológico.

O avanço na área de pesquisa e produção de medicamentos, além da psicoterapia, têm auxiliado muitos pacientes no tratamento. Há uma variedade inclusive de remédios que são prescritos pelos psiquiatras de acordo com as características e adaptabilidade de cada paciente. Devido ao grande aumento de casos depressão e outros transtornos mentais em todo mundo, a Assembleia Mundial da Saúde aprovou uma resolução exigindo uma resposta integral para tentar impedir a ascensão e melhorar a condição de saúde mental das pessoas.

Cientes da necessidade de oferecer alternativas complementares aos tratamentos convencionais, grupo de pesquisadores e estudantes de graduação e pós-graduação do Instituto Integrado de Saúde (Inisa) e da Faculdade de Medicina da UFMS, coordenado pelo ex-professor visitante (agora professor voluntário) na Universidade Daniel Boullosa, pretende verificar os efeitos do treinamento de sprints curtos (explosão de velocidade e potência) nos sintomas de depressão. O grupo conta ainda com parceria dos profissionais do Hospital Universitário Maria Aparecida Pedrossian (Humap/UFMS-Ebserh) e a participação do professor Felipe Barreto Schuch da Universidade Federal de Santa Maria, o pesquisador mais reconhecido no Brasil sobre exercício e saúde mental.

“Trata-se de um projeto de pesquisa que conta com financiamento do CNPq para verificar o efeito de treinamento de sprint curtos em sintomas de depressão, nos diferentes aspectos da condição física e na inflamação sistêmica dos pacientes”, explica Daniel. Segundo o professor, evidências prévias já sugerem a efetividade deste tipo de intervenções com exercícios de alta intensidade, porém o projeto de pesquisa é inovador ao avaliar um treinamento com sprints curtos e com curta duração de tempo por sessão. “A grande originalidade da nossa pesquisa é trabalhar com modelos de sprint, muito bem tolerado pelos pacientes, já que precisam de seis treinamentos de dez minutos de duração ao longo de duas semanas, ou seja, três vezes por semana. Se confirmarmos a hipótese de que é realmente efetivo o treinamento, estaremos encontrando uma intervenção não farmacológica, sem efeitos adversos e de alta efetividade em pouco tempo”, destaca.

De acordo com o professor, o público-alvo do projeto são mulheres com idade entre 18 e 60 anos, diagnosticadas com depressão moderada à grave. “Também adotamos alguns critérios de exclusão, como ser ou não fumante, que precisam ser verificados”, ressalta Daniel. Ele salienta que podem participar como voluntárias acadêmicas, professoras e técnicas da Universidade, e aquelas que não tenham ligação direta com a UFMS.

“No momento seguimos levantando dados. Implementamos o projeto um pouco antes do início da pandemia, precisamos parar por um tempo e isso dificultou as coletas de dados. Aos poucos fomos retomando as atividades e, hoje, estamos recebendo pacientes”, diz Boullosa. “Os resultados preliminares são bastante promissores, porque parece que além do que já estava verificado na literatura, ou seja, da melhora da condição física; os sintomas da depressão melhoram após as primeiras sessões de exercício. Portanto, parece que é efetiva essa abordagem”, comenta Daniel.

Mestrandas

Estão envolvidos nas atividades do projeto estudantes de graduação em Fisioterapia e Medicina, além do programa de pós-graduação em Ciências do Movimento. A educadora física e mestranda Jéssica Alves Ribeiro integra o grupo. “Essa pesquisa envolve pessoas que fazem tratamento de depressão e também aquelas que não fazem ainda o tratamento. As que têm interesse em participar podem nos procurar. Inicialmente, fazemos umas breves perguntas para verificar os critérios de inclusão”, explica Jéssica.

Além desse primeiro requisito, segundo a mestranda, é agendada uma entrevista no setor de psiquiatria do Humap-UFMS. A conversa é mantida em sigilo e realizada apenas com a presença do profissional e da paciente. “A pessoa responde a dois questionários, sendo um para avaliar o grau da depressão e outro para verificar se ela tem algum outro tipo de transtorno”, fala a mestranda. “Se a pessoa for elegível, marcamos uma entrevista com a paciente para verificar se ela pode fazer atividade física de baixo impacto, já que é em uma bicicleta ergométrica e por isso é mais tranquilo participar”, acrescenta a educadora física.

“Nesse encontro também fazemos a avaliação física, verificando peso, altura, dobras, pressão arterial, frequência cardíaca, enfim todo um processo para marcarmos um teste cardíaco que vai dizer como está a aptidão física da voluntária. O teste demora menos de dez minutos e é feito na bicicleta. São realizados ainda exames de sangue”, diz Jéssica.

A mestranda explica que após os testes, a pessoa participa da pesquisa. “Começamos com protocolo leve, tranquilo, a pessoa pedala leve por no máximo dez minutos. Após isso, vamos aumentando a intensidade nos dias posteriores”, detalha. Ela detalha que a cada um minuto é aumentada a carga do exercício para e a cada dois minutos de sprint, medimos a pressão arterial e outras aferições. “Também trabalhamos com a escala afetiva, ou seja, como ela está lidando com esse processo”, fala Jéssica. Após seis meses, as pacientes são novamente avaliadas.

Segundo Jéssica, cerca de 30 mulheres já participaram dos testes. “Esse estudo é extremamente importante por conta de a população ter dificuldades em fazer atividades por muito tempo. Queremos facilitar isso e propor que com apenas uma hora de exercício em duas semanas a pessoa já consegue desenvolver um comportamento menos sedentário, passa a gostar da atividade física em si, e aproveitar os benefícios que são inúmeros”, reforça a educadora física. A administradora Viviane Souza participou do teste e relata que depois disso nunca mais largou os exercícios. “Não tinha vontade de fazer nada, ficava apenas deitada. Mas, aí, voltei a me exercitar e, hoje, faço pilates. Além da academia, também faço capoeira”.

“Tem sido uma experiência muito boa, por ser fisioterapeuta não tinha muita noção do quanto a atividade física ajuda tanto na parte física como na mental. Já na minha formação, participar desse projeto me ajuda a procurar melhores evidências de tratamentos para meus pacientes e, além disso, proporciona um trabalho multidisciplinar”, destaca a fisioterapeuta e mestranda em Ciências do Movimento Vilma Lima Vilela. As mulheres que se encaixam no perfil descrito pelos pesquisadores e quiserem participar podem procurar o ambulatório do Humap-UFMS/Ebserh.

Texto: Vanessa Amin

Fotos: Vanessa Amin/Acervo pesquisadores