Imagens do artigo publicado na ChemMedChem

Composto colabora na busca de tratamento contra o adenocarcinoma renal

Para auxiliar na busca de tratamento contra o adenocarcinoma renal, um dos tipos de câncer mais letais, pesquisadores do Instituto de Biociências (Inbio) e da Faculdade de Ciências Farmacêuticas, Alimentos e Nutrição (Facfan) uniram-se na investigação de um composto organo-enxofre com potencial citotóxico e ação antitumoral.

O trabalho de pesquisa, coordenado pelos professores Edson dos Anjos dos Santos (Inbio) e Danielle Bogo (Facfan), tem a participação das mestrandas Ingrid Pereira (Química) e Camilla Nantes (Farmácia) e foi recentemente publicado na renomada revista europeia ChemMedChem.

“Durante o Doutorado, obtive compostos, não planejados, então, fui atrás para descobrir o que era, do que se tratava. Descobri que eram compostos que chamamos de dissulfeto de arila e tiossulfonato de arila. Na literatura, havia muitas patentes de indústrias, para fabricação de tintas, polímeros, etc., mas pouca aplicação na área medicinal, e me despertou o interesse em investigar essas moléculas devido à presença do átomo de enxofre”, relata o professor Edson.

O primeiro trabalho surgiu com a síntese de algumas classes, ainda no doutoramento, a partir de um ensaio larvicida, contra larvas de uma mariposa, responsáveis pela por atacarem grãos armazenados ou processados. Os compostos foram capazes de inibir a atividade de uma das enzimas responsáveis pela digestão de proteínas na larva, impedindo que o alimento fosse digerido e, assim a larva era incapaz de absorver os nutrientes, ocasionado a sua morte.

A pesquisa voltou-se para a área da química medicinal, a partir dos relatos das atividades desses compostos contra alguns tipos de doença.

“Porém, ainda não havia o ensaio de citoxicidade em linhagens de células cancerosas, células que causam o câncer. Procuramos investigar o mecanismo de ação, como poderiam essas moléculas atuarem para inibir o crescimento de um tumor ou o desenvolvimento de uma célula tumoral. Por isso, foi feita essa parceria com a professora Danielle, para realizar os ensaios de algumas linhagens de células tumorais”, expõe.

De primeiro, foi feito o ensaio de inibição do crescimento celular de algumas linhagens de células tumorais, para ver como esses compostos iriam agir sobre essas células.

E os resultados foram fantásticos, segundo o professor. “Um chamou atenção, o composto 6, que é um tiossulfonato de arila, que apresentou uma atividade muito interessante contra as células de adenocarcinoma renal, que é uma célula que provoca o câncer no rim”.

Diante desse resultado, os pesquisadores decidiram investigar mais sobre como essa molécula atuaria na inibição do crescimento da célula cancerosa, um dos grandes desafios das quimioterapias.

“A célula cancerosa se diferencia em um único ponto da célula normal: na taxa de crescimento, porque cresce com uma velocidade muito maior. Porém é uma célula do organismo, por isso que muitas vezes a quimioterapia acaba prejudicando o indivíduo, já que é muito difícil o composto fazer essa seleção entre uma célula normal e uma cancerosa. Por isso, há os efeitos colaterais”, afirma o pesquisador.

O composto também foi testado com uma célula normal, utilizada para fazer esse tipo de ensaio e foi verificado ainda qual seria a concentração para inibir o seu crescimento. “Porque não adianta se ter um composto ótimo, que inibe o crescimento da célula cancerosa, mas na mesma concentração inibe o crescimento da célula normal, podendo ser letal aos pacientes. Tem que haver uma maior seletividade”.

Ou seja, o composto tem que ser mais potente para a célula cancerosa. E o resultado mais uma vez foi ótimo, já que o composto foi sete vezes mais seletivo para matar a célula cancerosa do que a normal.

Depois desses ensaios in vitro, com células cultivadas em laboratório, os pesquisadores foram avaliar se o composto tinha alguma interferência no ciclo celular, algo importante porque a célula cancerosa faz esse ciclo muito rápido e vai se dividindo e a existência de mecanismos para interromper essa divisão pode ser um tipo de alvo para o tratamento do câncer.

“Ao avaliar isso, percebemos que esse composto aumentava o número de células em uma determinada fase. Isso quer dizer que não estava passando para a próxima, como se tivesse interrompido ali, congestionado uma grande quantidade de células naquela etapa. Justamente na fase de mitose, que é a divisão celular, sendo então a última fase do ciclo celular”, diz.

Isso significa que o composto causou um problema naquela fase e ao não dividir, a célula morre. Foi então que os pesquisadores fizeram um ensaio antitubulínico. A tubulina são proteínas que quando polimerizadas compõem os microtúbulos.

“Ao se interromper essa polimerização, não se consegue formar os microtúbulos, então, detectamos uma ação antitubulínica do composto. Esse ensaio foi feito National Cancer Institute (NCI), dos Estados Unidos, com o pesquisador Ernest Hamel”, explica Edson.

Os pesquisadores procuraram ainda saber se o composto também poderia causar apoptose, a morte celular, o que foi identificado, e assim os levou a investigar o porquê da apoptose quando se utilizava o composto.

“Foi feita uma avaliação para verificar a expressão da caspase-3, uma proteína que a célula produz durante o processe de apoptose, a morte celular programa. E o composto também foi capaz de induzir a produção de caspase-3, indicando que quando a célula está na presença desse composto, pode ocorrer a apoptose”, completa.

Conclusão

Os resultados mostraram que o composto 6, um tiossulfonato de arila foi capaz de impedir o crescimento de células cancerosas – no caso do adenocarcinoma renal, por meio da inibição da polimerização da tubulina.

“Por isso, observamos uma grande quantidade de células na fase de divisão celular e também visualizamos a morte celular, a apoptose, que quando a célula tumoral está na presença desse composto produz a caspase-3, que é sinalizador de apoptose na célula”, explica Edson.

O adenocarcinoma renal não é um dos canceres que mais atinge a população, relata o professor, contudo é um dos mais letais, muito agressivo e é considerado uma célula cancerosa quimiorresistente.

“Esse composto já havia sido estudado, mas não para essa aplicação, mesmo assim, aqui no Brasil não se permite patentear. Mas, independente disso, fizemos esse estudo para mostrar aos pesquisadores que vale a pena investigar substâncias dessa classe para esse tipo de câncer. Eles vão ver o que há nas estruturas para auxiliar num novo protótipo, para algo até melhor do que o nosso”, afirma.

O artigo publicado já foi citado em outras publicações. “Quando não se consegue patentear, me sinto na obrigação de divulgar para que outras pessoas vejam e tentem fazer melhor ou para ajudar no caminho da pesquisa deles. Espero que na Universidade tenhamos um local de base tecnológica, uma Parque Tecnológico, por exemplo, um local onde os resultados das pesquisas venham a se tornar uma inovação”, finaliza.

O professor lembra que muito tem se ouvido falar nessa época do Coronavírus da reposição de fármacos, então, nesse caso, seria a reposição de um novo tipo de agente/substância para outra atividade.

Texto: Paula Pimenta